quarta-feira, abril 06, 2011

A dica do ‘Señor Libertadores’: ser duro, mas com sangue de barata

Sete participações, um título, um vice e duas eliminações na semifinal. Tudo bem que o futebol não tem lógica, mas se o Fluminense busca conselhos para saber como conseguir dar a volta por cima na Libertadores e se classificar para as oitavas de final, já sabe com quem conseguir. Com currículo extenso na competição, Souza tem experiência de sobra para ser chamado de o “Señor Libertadores” do elenco tricolor. Em um grupo recheado de debutantes, ele surge como o professor em uma disputa repleta de particularidades.

Catimba, jogadas ríspidas, pressão extracampo, torcidas ensandecidas e, principalmente, arbitragens diferenciadas. A Libertadores é assim, cheia de armadilhas, e não perdoa o erro, como dizia o ex-comandante tricolor Muricy Ramalho. Calejado com essas situações, Souza aceitou o convite do GLOBOESPORTE.COM para abrir seu baú de memórias e traçar características primordiais para o sucesso na competição que é a menina dos olhos de todo clube brasileiro.

- Tem que ser muito homem e ter sangue de barata, além de fazer aquilo que sabe em campo. Em dividida, tem que botar o pé. Não pode ir mole. Se for, os caras te quebram no meio. Além de encarar os jogos como se fosse uma outra competição qualquer. Esses são os conselhos que eu daria.

Provável vencedor da disputa com Deco por uma vaga entre os titulares nesta quarta, às 21h50m (de Brasília), no estádio Centenário, em Montevidéu, contra o Nacional, pela quinta rodada do Grupo 3, Souza entrará em campo não somente para defender o Flu, mas também uma marca pessoal: nunca foi eliminado na primeira fase da competição (caiu nas oitavas na pior participação, em 2007, com a camisa do São Paulo). Para evitar a decepção individual e coletiva, ele alerta para o principal diferencial da Libertadores: a arbitragem.

- Para ser falta, tem que ser mais falta do que o brasileiro está acostumado. Não tem essa história de se jogar. Eles não marcam. Além disso, existe muito o fator campo. Há a tendência de dar as coisas para quem está em casa. É muita pressão.

Pressão que é esperada também para o compromisso desta quarta na capital uruguaia. Algo, porém, que Souza garante tirar de letra. Acostumado a enfrentar sul-americanos das mais diferenciadas nacionalidades, ele não tem dúvidas em apontar os piores adversários.

- Os argentinos são nojentos. Até porque, eles catimbam e têm qualidade. São times acostumados a decisões. São caras que entram para rachar mesmo, até de forma desleal. É a cultura deles.

Contra os “hermanos”, porém, Souza viveu seus jogos inesquecíveis pela Libertadores, em confrontos contra o River Plate, com a camisa do São Paulo, pela semifinal em 2005, ano em que saiu campeão. Essa, inclusive, é uma das revelações do meia tricolor em papo a seguir:

Com uma relação tão estreia com a Libertadores, você se recorda quando foi sua estreia na competição?

Não, cara. Faz tanto tempo. Foi em 2004. Não tenho uma lembrança exata. Claro que a Libertadores, a primeira, e por um time grande, foi muito importante, mas eu já tinha disputado algumas competições sul-americanas. Fui vice-campeão da Copa Conmebol com 18 anos pelo CSA (em 1999), quando fomos o primeiro clube do Nordeste a chegar em uma final internacional. Perdemos para o Talleres, na Argentina. Já tinha essa experiência.

E participar de uma Libertadores em si pela primeira vez? Foi algo especial?

Foi especial porque em 2003 eu fiz o gol que classificou o São Paulo para a competição depois de muitos anos, em partida no Brasileirão, contra a Ponte Preta. Então, foi muito gratificante por contribuir para este sonho dos são-paulinos. Já no ano seguinte, em 2005, fomos campeões, e vice em 2006.

Qual a melhor é sua melhor recordação da competição? Alguma partida inesquecível?

A melhor recordação, não só para mim mas para todo são-paulino que fala comigo e lembra, foram os confrontos contra o River pela semifinal de 2005. O Cicinho estava na Seleção e pude jogar. No Morumbi, entrei com o jogo 0 a 0, todo mundo dizia que o juiz iria favorecer o River, que o jogo estava comprado, e acabei mudando a partida. Esse foi um dos melhores jogos da minha carreira. Já em Buenos Aires, fui considerado o melhor jogador em campo. Outra lembrança boa foi nas quartas de final do mesmo ano, contra o Tigres, do México. Comecei jogando em São Paulo, ganhamos de 4 a 0, fiz gol, e depois fora de casa perdíamos por 2 a 0, não podíamos levar para os pênaltis, e fiz o gol que garantiu a classificação.

Em 2005, então, além do título, foi uma participação inesquecível pessoalmente também...

Sim, mas minha melhor Libertadores foi em 2009, pelo Grêmio. Tive a oportunidade de ser o artilheiro do time, com seis gols, e fui muito importante (NR: o clube gaúcho foi eliminado pelo Cruzeiro na semifinal).

Fala-se muito que a Libertadores é uma competição diferente, com muita catimba, provocação. Você tem alguma experiência nesse sentido ou algo inusitado que possa servir de exemplo?

O que muda muito é a questão da arbitragem, da cultura das pessoas, da pressão. É uma competição que tem o seu glamour por fugir do corriqueiro. São partidas contra adversários que não são comuns de enfrentar, como agora diante do Nacional, um clube com tanta história. Essa é a principal diferença. Mas o que mais me chamou a atenção foi a arbitragem. Não podemos jogar aquele jogo das antigas, de dar uma porrada sem bola, que é algo que ainda acontece.

E você já sofreu com isso de apanhar sem bola ou ser muito provocado?

Neste jogo contra o River Plate mesmo, em Buenos Aires, em 2005, o time deles tinha visto minha atuação no primeiro jogo e ficava me ameaçando, dizia que não ia sair do estádio, xingava minha mãe. É importante ter sangue de barata nessas horas.

Já sendo campeão, vice, e com inúmeras situações na competição, como está lidando com esse risco de ser eliminado ainda na primeira fase? E o que você passa de experiência para o grupo absorver bem essa pressão?

Esse é um fato novo. Em todas as Libertadores que disputei antes, já tínhamos meio que classificado com antecedência. Agora, vamos entrar em campo tendo que vencer dois jogos. O que procuro conversar com o pessoal ou com jogadores que sou mais próximo é de que é preciso ter calma. Em nenhuma competição se decide jogo sozinho ou logo no começo. Não temos que entrar em campo e se mandar para o ataque. Teremos 90 minutos para impor o nosso ritmo, para fazer os gols. E o Nacional também precisa do resultado. Por isso, é importante estar bem posicionado e tranquilo.

E os jogadores mais jovens do elenco te procuram para pedir conselhos sobre esse tipo de postura ou até mesmo ajuda em momentos importantes como esta partida em um estádio com a história do Centenário?

Hoje em dia isso não acontece. Às vezes, o jogador mais jovem tem receio em fazer uma pergunta. Eu, não. Sempre que quiser perguntar alguma coisa procuro o Deco, os caras mais experientes, vencedores, com rodagem mundial. Mas os mais jovens hoje em dia têm outra cultura. Acham que, se perguntarem, o outro vai se achar superior. E isso não existe. Futebol é uma troca de informações. Ninguém ainda veio me perguntar nada. Acho que mais por receio.

Em relação a todos os adversários sul-americanos, qual é o mais chato, enjoado, difícil de lidar em campo?

Os argentinos são nojentos. Até porque, eles catimbam e têm qualidade. São times acostumados a decisões. Foram os confrontos mais difíceis. Nesse contra o River mesmo, lembrando mais uma vez, tinha muita gente assim. Mascherano, Lucho Gonzalez, D´Alessandro, Farias... Muita gente que provoca o tempo inteiro. Os jogos contra o Boca também são assim. É a cultura deles. São caras que entram para rachar mesmo, de forma desleal até. Faz parte do estilo dos sul-americanos sem ser brasileiros.

Há alguma fórmula para lidar com isso? Qual a dica que você daria para um jogador que quer ter sucesso na Libertadores?

Tem que ser muito homem e ter sangue de barata, além de fazer aquilo que sabe em campo. Não dá para achar que é uma competição de outro mundo. Libertadores é uma competição como outra qualquer, mas com algumas coisas diferentes. É o caso da arbitragem. Em dividida, tem que botar o pé. Não pode ir mole. Se for, os caras te quebram no meio. Esses são os conselhos que eu daria.

Quando se fala em arbitragem, qual a principal diferença?

Para ser falta, tem que ser mais falta do que o brasileiro está acostumado. Não tem essa história de se jogar. Eles não marcam. Além disso, existe muito o fator campo. Há a tendência de dar as coisas para quem está em casa. É muita pressão.

Você que é um cara descontraído e já está na sétima Libertadores, dá para dizer que arriscar bem um espanhol ou prefere ficar na sua?

Não vou me arriscar, não. Joguei no Libertad, do Paraguai, e sabia falar, mas tem muito tempo que não falo e não quero errar. Se isso acontecer, a concentração todinha pega no meu pé. Viu com o Berna no jogo contra o América do México? Ele começou a falar a “vuela, vuela, vuela” para falar da bola e isso não existe (risos). Então, prefiro não me arriscar. (NR: bola em espanhol se chama pelota).

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